O “cuidado”_ reflexões fenomenológicas sobre a psicoterapia na contemporaneidade

O “cuidado”: reflexões fenomenológicas sobre a psicoterapia na contemporaneidade

A palavra cuidado de acordo com seu significado em dicionários faz menção ao ato de demonstrar atenção ao outro, em que há cautela, prudência, onde se medem os riscos, sendo assim, podemos inferir este ato como elemento primordial no processo terapêutico.

O “cuidado” para a psicoterapia

O “cuidado” na perspectiva fenomenológica existencial, uma das abordagens da Psicologia, está muito relacionado ao plano da própria existência do homem, do questionamento diário, das vivências do sofrimento e das possibilidades de mudanças. O cuidado é uma essência deste processo.

Cuidar na psicoterapia é possibilitar um relacionamento dinâmico, de forma temporal, que acontece no presente momento no sentido amplo da palavra. No aqui e agora. O cuidado que permite você como cliente tomar consciência e conhecimento de si mesmo.

Aqui não estou falando de subjetivismo ou das ferramentas utilizadas pelo profissional no cuidado (Psicoterapeuta) ou ao embasamento teórico da técnica, nem mesmo está relacionado apenas a pessoa que é cuidada (Cliente), mas é muito mais abrangente do que estes fatos. O processo psicoterapêutico é constantemente criativo, algo construído, algo legítimo, que se inventa e se reinventa a cada vivência de cuidado que o psicoterapeuta exerce no contato cara a cara com o cliente. Este processo se edifica de forma progressiva.

A cada vivência do cuidar e de ser cuidado gera uma experiência única, singular e de transformação.

No nosso mundo atual pode-se observar como as pessoas têm dificuldade em lidar com os fenômenos que os acometem e com o turbilhão de sentimentos que lhes sobrevém. Sabe por que isso acontece? Porque há uma fuga destes sentimentos ou uma busca frenética pelo seu controle.

Um sintoma claro dessa forma contemporânea de ser é a falta de capacidade clara para tratar dos fenômenos que lutam firmemente a um ajuste desesperado de sentidos disponíveis. Estes sentidos se clarificam e são interpretados como sendo estes: a dor, a solidão, o amor, o envelhecimento e a morte. Conforme as experiências de angústia aumentam, cresce também a necessidade de desviar e controlar essas vivências interiormente e exteriormente.

Acabar em passos acelerados o sofrimento psíquico é terminar com qualquer discussão dos limites aceitáveis do horizonte habitual do que faz real sentido. Em outras palavras: A busca por soluções imediatas e rápidas para acabar com a angústia e o sofrimento está cada vez mais procurada, no entanto, o problema em si não é tratado, ouvido ou direcionado à própria consciência do ser.

Com essa fuga dos sentimentos e a busca por controle muitas pessoas aderem ao uso de remédios ou outras substâncias, as quais podem até melhorar ou mascarar os sintomas por hora, mas não tratam das causas e ainda impedem o autoconhecimento.

A fenomenologia e seu papel no “cuidado”

A abordagem fenomenológica existencial tem papel importante na experiência do cuidado e na relação cuidador e indivíduo que é cuidado. Esta relação terapêutica poderá possibilitar uma compreensão dos sofrimentos existenciais reais da pessoa no processo terapêutico.

O cuidado psicoterapêutico é algo natural, nele há suspensão de ideias utópicas nas buscas imediatistas de como surge o sofrimento, mas é uma construção com a experiência diária e uma análise do próprio campo experiencial de sentido do cliente.

A psicoterapia como cuidado pela vida pode ser definida pelo olhar existencial de como está a pessoa e colaborar para a abertura das suas possibilidades de ser no mundo.

Atualmente, psicoterapeutas de diferentes abordagens reconhecem cada vez mais as transformações históricas das manifestações psicopatológicas do sofrimento existencial.

Compreender com olhar fenomenológico uma vivência de sofrimento é entender o sentido a partir do qual sua emergência de tratamento se torna possível.

O cuidado psicoterapêutico demanda do profissional Psicólogo uma atenção e uma forma de pensar diferente do senso comum e do caráter apenas científico. Por isso deve-se ter a suspensão de pressupostos, crenças e saberes, proporcionando o surgimento de tudo que se encontra em suas próprias possibilidades e que acontecem de forma singular para quem o vive e experimenta.

Umas das grandes inquietações da humanidade estão relacionadas a ansiedade patológica ou ansiedade neurótica. Onde o indivíduo não entra em confronto com sua ansiedade normal, que a reduz ou nega sua relação com sua própria existência, que por sua vez está relacionada as infinitas possibilidades de escolhas.

Hoje, as escolhas feitas são inautênticas e pouco corajosas. As pessoas cada vez mais se arriscam menos em tudo. Tem medo e receio de tudo. Medo da perda de controle de uma situação. A ausência do poder pessoal para ampliar as suas potencialidades. A ansiedade existencial e o fracasso na confrontação com os conflitos aumentam cada vez mais, acarretando perturbações metais, frustações existenciais com a falta de sentido, desajustes comportamentais, aborrecimento, apatia, estranheza e afastamento de si mesmo.

Como você está escolhendo suas possibilidades de existir ?

Como você escolhe construir o seu mundo?

A saúde mental se define pela habilidade da pessoa para passar pelas complexidades da sua vida e das relações com os outros e o mundo.

O processo terapêutico possibilitará este cuidado que todo ser humano necessita e facilitará a condução para o alcance de uma saúde mental e bem estar satisfatória.

Também vale um alerta para a famosa racionalização contemporânea: Devemos ter todo o cuidado com o excesso da racionalização, esta crença de que tem uma explicação racional para tudo, desvalorizando a psicoterapia e a possibilidade de se obter um conhecimento com base nas significações afetivas e subjetivas que a terapia pode te proporcionar.

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