Relacionamentos abusivos em isolamento social
7 de julho de 2020
O contexto de isolamento social tem trazido à tona muitas situações. Uma das preocupações nesse momento diz respeito às diferentes violências. A violência doméstica dentro de relacionamentos abusivos tem sido crescente, uma vez que as situações como a interrupção dos contratos, desemprego, mudanças na rotina, ocasionam um convívio “forçado” dentro de relações que provavelmente já vinham dando sérios sinais de alerta.
E os relacionamentos abusivos?
Nos últimos 10 anos, avançamos muito em termos do reconhecimento das relações abusivas. Compreendemos que os relacionamentos abusivos ocorrem de forma sutil, são difíceis de serem notados, e estão dentro de um ciclo, que se repete, até o momento em que ocorre uma ruptura.
No relacionamento abusivo temos a figura do abusador ou abusadora, como alguém que geralmente estabeleceu outras relações tóxicas ao longo da vida e, manipula o outro como uma forma de manter o seu poder na relação.
Por diversos motivos, o outro vai legitimando esse poder, sem inicialmente se dar conta. Falamos então de uma relação de dependência que vai se evidenciando, entre ambos.
Diversos contextos abusivos
Muito se discute sobre os relacionamentos abusivos entre casais heterossexuais, situando principalmente os homens como os abusadores. Há alguns anos atrás, quem mais recorria à terapia nos contextos abusivos eram realmente as mulheres, que sofriam violências por parte dos seus parceiros.
No entanto, o abuso também ocorre por parte das mulheres em relação aos homens, nas relações homossexuais, entre familiares, amigos e/ou no ambiente de trabalho.
Nas relações homo ou heterossexuais, os abusos seguem padrões semelhantes, que vão do romance (lua de mel) às explosões. Inicialmente o parceiro ou a parceira parecem ser perfeitos e, aos poucos os ciúmes generalizados passam a ser frequentes, assim como a “invasão” dos espaços pessoais, que demonstram a desconfiança, há um isolamento social que vai sendo imposto, as críticas ficam mais frequentes, assim como as explosões e a culpabilização do outro devido à falta de controle por parte do abusador ou da abusadora.
Não bastasse tudo isso, as desculpas surgem em algum momento e, quando surge a percepção de uma falsa calmaria, ocorrem repetições nesse processo.
Nas relações familiares, entre amigos e/ou no ambiente de trabalho também existe a figura que tenta manipular favoravelmente as situações como forma de se sentir superior.
Essa pessoa consegue se passar por importante, consegue trazer outras pessoas para perto dela, consegue fazer com que as suas vontades sejam postas em prática. Contudo, ao longo do tempo vai fazendo com que o outro perca a voz, expresse menos as suas vontades, se “encolha na sua realidade”. Dessa forma, o outro passa pela minimização e começa de fato a ser inferiorizado, por palavras, por ações e escolhas.
Isolamento e relacionamentos abusivos
Se inicialmente falei sobre a violência, precisamos compreender que os relacionamentos abusivos comportam várias violências, que podem ser intensificadas com o isolamento. Para além da violência psicológica, podemos falar sobre a violência física, sexual e patrimonial, como as mais prováveis nesse período.
A distância pode suscitar cobranças maiores em relação ao que o outro está fazendo, com quem está falando ou quem está com ele naquele momento (é o caso de casais de namorados e familiares).
No home office ou em situações que envolvem tensões laborais, um superior ou colega pode cobrar muito mais em termos de horários a serem cumpridos e trabalhos a serem entregues, perseguir, expor o outro e humilhá-lo por meio das críticas. O abuso, nesse caso, envolve o que entendemos também por assédio moral.
Mas, os que estão fisicamente próximos ficam ainda mais vulneráveis.
O isolamento modifica a rotina de todos. Há uma intensificação dos sentimentos e emoções, que se não forem bem trabalhados, podem ser externalizados de formas extremas.
Se um relacionamento já era conflituoso, em um momento de incertezas esse relacionamento provavelmente tomará outras proporções. No caso dos relacionamentos abusivos, eles podem se tornar mais perceptíveis para aqueles que o vivenciam, contudo, o distanciamento social dificulta a visão por parte dos que estão fora dele.
E o que fazer?
Falamos sobre diversas relações abusivas. Nesse contexto, o atendimento psicológico é essencial mas, outras intervenções são necessárias. Buscar pessoas da sua rede que possam ser avisadas sobre essa relação que você possa ter como ponto de apoio, é um elemento chave para iniciar o processo de ruptura.
Caso esteja ciente de alguém que vivencia o relacionamento, estreitar o diálogo, se mostrar presente para essa pessoa, tentar acompanhar o que tem vivido (mesmo que por telefone ou mensagens) são caminhos sugeridos.
As relações abusivas causam muitos impactos emocionais. Então, procurar formas de acolhimento para quem as vivencia é de suma importância. Atualmente, as redes sociais facilitam o contato direto com organizações, profissionais e grupos que prestam serviços que vão da escuta à ação, caso a situação seja emergencial. Na pandemia esses coletivos continuam ativos e atentos.
As instituições formais, como os núcleos de atendimento das Defensorias Públicas, serviços de assistência e Delegacias, continuam em funcionamento. Se você está em um relacionamento abusivo, por mais difícil que seja sair dele, você não está sozinho (a)! Dar o primeiro passo é necessário.