Suicídio Juvenil
22 de setembro de 2020
Discorrer sobre suicídio na adolescência é uma necessidade. Primeiramente, as estatísticas apresentam um aumento mundial nessa taxa ao longo dos últimos anos, apontando que os jovens passaram a se suicidar mais que os adultos com idade acima de 45 anos, sendo o suicídio a segunda causa de morte na faixa etária dos 15─29 anos (Psic, 2011; WHO, 2014). Nesse contexto, atentar-se para os modos de ser e viver a juventude é importante, pois a adolescência costuma ser marcada por modificações biopsicossociais que podem ser acompanhadas de conflitos e angústias (Abasse, Oliveira, Silva, & Souza, 2009; Hildebrandt, Zart, & Leite, 2011; Pisani et al., 2012).
Suicídio juvenil: o ápice de uma ideia
Assim, ter, ocasionalmente, ideias suicidas no período da adolescência não é anormal, uma vez que pode ser considerada parte do processo evolutivo, pois o intento suicida pode ser uma forma encontrada pelo jovem para solucionar imaginariamente problemas existenciais. No entanto, é importante ter clareza do que se torna patológico na adolescência e o suicídio é um tema de particular importância nesse sentido (Borges & Werlang, 2006; WHO, 2014).
A depressão, a ideação ou a tentativa prévia de suicídio são considerados como os principais preditores para o suicídio juvenil (Botega et al., 2005; Hawton, Saunders, & O’Connor, 2012; Psic, 2011). Dessa forma, acredita-se que em mais de 50% dos suicídios entre adolescentes a depressão estava presente e, destes, 25% realizaram o intento suicida prévio, dentre os quais 15% consumaram o ato (Pisani et al., 2012). Além disso, estima-se que em meio à população total de crianças e adolescentes, 40% já tiveram alguma ideação suicida compreendida como séria ao longo da vida e 60% dos que consumaram o suicídio, idealizaram-no previamente. Assim, o ato suicida é visto como a finalização de um processo que se fortalece diariamente (Marquetti, Kawauchi, & Pleffken, 2015; Silva et al., 2006).
Sinais comportamentais
Para lidar com a questão, o Ministério da Saúde brasileiro já destacou que uma das maneiras mais eficazes para prevenir o suicídio é por meio da identificação de sinais comportamentais (crenças e comportamentos em determinados contextos), os quais indicariam o risco de uma atitude suicida (Marquetti et al., 2015). Nesse contexto, a literatura mostra que são usualmente circunstâncias/contextos de risco para o suicídio juvenil: a baixa autoestima/sentimento de inadequação, separação dos pais/conflitos familiares, desilusão amorosa/ término de namoro e a opressão e vitimização pelo grupo (bullying) (Araújo, Vieira, & Coutinho, 2010; Gonçalves, Freitas, & Sequeira, 2011; Hawton et al., 2012; Hildebrandt et al., 2011).
Aliado aos contextos de maior ocorrência das tentativas e do suicídio propriamente dito, alguns fatores considerados suicidógenos na adolescência apontados pela literatura são: a carência do suporte familiar, escolar e profissional, a impulsividade/desespero e ideias de morte. Assim, acredita-se que, em contextos considerados de risco, a existência desses fatores aumenta a probabilidade do ato suicida, demonstrando que há mais de um problema em cada suicídio, bem como riscos cumulativos (Pisani et al., 2012; Borges & Werlang, 2006).
Investigando o suicídio juvenil
Estudos na temática também fazem o uso do termo “suicídio contagioso” para se referir ao suicídio na adolescência. Essa concepção pressupõe que o comportamento suicida pode ser aprendido por meio de imitação, sugerindo que aqueles que conhecem alguém que se matou tenderiam a ter mais pensamentos suicidas do que os que não tiveram tal conhecimento (Aquino, 2009; Waiselfisz, 2014). Assim, considerando essa possível relação, o contato com contextos (reais ou imaginários) do suicídio pode ser considerado uma via de análise da probabilidade de tentativa, pois isso permitiria avaliar a crença dos indivíduos diante da situação experienciada por algum outro próximo ou parecido consigo.
Ao se investigar tal aspecto, especialmente em contextos imaginados, torna-se factível identificar crenças que estariam mais ou menos fortemente associadas à crença de plausibilidade do comportamento suicida em cada contexto, objetivando entender como eles avaliam, explicam o ato de um outro indivíduo que tenha tentado (com ou sem sucesso) o suicídio. Entende-se por crença desejos que guiam e moldam a ação humana, seria uma indicação mais ou menos segura de se encontrar estabelecido algum hábito que determinará as ações (Peirce, 1877).
Fatores suicidógenos e contextos facilitadores
No que se refere ao suicídio na adolescência, acredita-se que a crença favorável ou não a esse ato pode ser ativada pelo contexto social ao qual o individuo está inserido, compreendendo-o como possível resposta a um conflito entre crenças para a vida e para a morte (Aquino, 2009). Logo, acredita-se que a crença de maior ou menor favorabilidade em relação ao suicídio pode ser influenciada por diferentes fatores suicidógenos e contextos facilitadores desse comportamento, ou seja, em determinadas situações, o indivíduo pode avaliar como mais justificável (crença favorável) ou menos justificável (crença desfavorável) o ato suicida de outrem. Isso pode ajudar a entender seu próprio comportamento perante uma possível tentativa de suicídio, pois ele pode se encontrar (no presente ou no futuro) em uma situação similar àquela que julgou compreensível a tentativa de suicídio de outra pessoa.
Suicício juvenil – Referências Bibliográficas
Parte 1
Abasse, M. L. F.; Oliveira, R. C.; Silva, T. C., & Souza, E. R. (2009). Análise epidemiológica da morbimortalidade por suicídio entre adolescentes em Minas Gerais, Brasil. Ciência Saúde Coletiva, 14 (2), 407-416. https://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232009000200010
Aquino, T. A. A. (2009). Atitudes e intenções de cometer suicídio: Seus correlatos existenciais e normativos. Tese de Doutorado, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa.
Araújo, L.C., Vieira, K. F. L., & Coutinho, M. P. L. (2010). Ideação suicida na adolescência: Um enfoque psicossociológico no contexto do ensino médio. Psicologia-USF, 15, 47-57. https://dx.doi.org/10.1590/S1413-82712010000100006
Baggio, L., Palazzo, L. S., & Aerts, D. R. G. de C. (2009). Planejamento suicida entre adolescentes escolares: Prevalência e fatores associados. Caderno de Saúde Pública, 25,142-150. https://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2009000100015
Bandeira, C. M., & Hutz, C.S. (2010). As implicações do bullying na auto-estima de adolescentes. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional , 14, 131-138.
Barros, S. M. (2014). Violência nas relações de namoro juvenis e ideação e comportamentos suicidas. Dissertação de Mestrado em Medicina Legal, Universidade do Porto.
Borges, V. R., & Werlang, B. S. G. (2006). Estudo de ideação suicida em adolescentes de 15 a 19 anos. Estudos de psicologia, 11 (3), 345-351. https://dx.doi.org/10.1590/S1413-294X2006000300012
Parte 2
Botega, N. J., Marín-León, L., Oliveira, H. B., Barros, M. B. de A., Silva, V. F., & Dalgalarrondo, P. (2009). Prevalências de ideação, plano e tentativa de suicídio: Um inquérito de base populacional em Campinas, São Paulo, Brasil. Caderno de Saúde Pública, 25 (12),2632-2638. https://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2009001200010
Dutra, E. (2011). Pensando o suicídio sob a ótica fenomenológica hermenêutica: Algumas considerações. Revista da Abordagem Gestáltica, 17 (2), 152-157.
Frazão, P. (2003). De Dido a Dédalo: Reflexões sobre o mito do suicídio romântico na adolescência. Análise Psicológica, 21 (4).
Gonçalves, A., Freitas, P., & Sequeira, C. (2011). Comportamentos suicidários em estudantes do ensino superior: Factores de risco e de protecção. Millenium, 40, 149‐159.
Hack, S. .M. P. K., & Ramires, V. R. R. (2010). Adolescência e divórcio parental: Continuidades e rupturas dos relacionamentos. Psicologia Clínica, 22, 85-97. https://dx.doi.org/10.1590/S0103-56652010000100006
Hawton, K., Saunders, K. E. A., & O’Connor, C. O. (2012). Self-harm and suicide in adolescents. The Lancet, 379, 2273-2282.
Hildebrandt, L. M., Zart, F., & Leite, M. T. (2011). A tentativa de suicídio na percepção de adolescentes: Um estudo descritivo. Revista Eletrônica de Enfermagem, 13 (2), 219-226.
Hutz, C. S., & Bardagir, M. P. (2006). Indecisão profissional, ansiedade e depressão na adolescência: A influência dos estilos parentais. Psico-USF, 11 (1), 65-73. https://dx.doi.org/10.1590/S1413-82712006000100008
Marquetti, F. C., Kawauchi, K. T., & Pleffken, C. (2015). O suicídio, interditos, tabus e consequências nas estratégias de prevenção. Revista Brasileira de Psicologia, 2, 30-40.
Parte 3
Matud, M. P., Ibáñez, I., Bethencourt, J. M., Marrero, R., & Carballeira, M. (2003). Structural gender differences in perceived social support. Personality and Individual Differences, 35, 1919–1929.
Monteiro, E. M. L. M., Nascimento, C. A. D., Almeida Filho, A. J., Araújo, A. K. A., Carmo, D. R. B., & Gomes, I. M. B. (2011). Percepção de adolescentes infratoras submetidas à ação socioeducativa sobre assistência à saúde. Revista da Escola Anna Nery, 15 (2), 323-330. https://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452011000200015
Moreira-Almeida, A., Lotufo Neto, F., & Koenig, H. G. (2006). Religiousness and Mental health: A review. Revista Brasileira de Psiquiatria, 38 (3), 242-250. https://dx.doi.org/10.1590/S1516-44462006005000006
Peirce, C.S. (1877). The fixation of belief. Popular Science Monthly, 12, 1-15.
Peron, S. I., Guimarães, L. S., & Souza, L. K. (2010). Amizade na adolescência e a entrada na universidade. Estudos e Pesquisas em Psicologia, 10 (3), 664-681.
Pisani, A. R., Schmeelk-Cone, K., Gunzler, D., Petrova , M., Goldston, D. B., Tu, X., & Wyman, P. A. (2012).Associations between suicidal high school students’ help-seeking and their attitudes and perceptions of social environment. Journal Youth Adolescence. 41, 1312–1324.
Parte 4
Psic, S. C. C. B. (2011). Factores de riesgo asociados a conductas suicidas en niños y adolescentes. Archivos de Medicina, 11, 62-67.
Rodrigues, D.G., & Pelisoli, C.(2008). Ansiedade em vestibulandos: Um estudo exploratório. Revista Psiquiatria Clínica, 35 (5), 171-177. https://dx.doi.org/10.1590/S0101-60832008000500001
Rosenburg, E. G. (2006). O impacto das vivências de psicologia realizadas nos meses que antecedem ao vestibular. Revista Em Extensão, 5, 19-29
Silva, V. F., Oliveira, H. B., Botega, N. J., Marin-León, L., Barros, M. B. A., & Dalgalarrondo, P. (2006). Fatores associados à ideação suicida na comunidade: Um estudo de caso-controle. Caderno de Saúde Pública, 22 (9), 1835-1843. https://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2006000900014
Souza, M. S., & Baptista, M. N.(2008). Associações entre suporte familiar e saúde mental. Psicologia Argumento, 26 (54), 207-215.
Vieira, L. J. E. S., Freitas, M. L. V., Pordeus, A. M. J., Lira, S. V. G., & Silva, J. G. (2009). “Amor não correspondido”: Discursos de adolescentes que tentaram suicídio. Ciência & Saúde Coletiva, 14 (5), 1825-1834. https://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232009000500024
Waiselfisz, J. J. (2014). Mapa da violência 2014: Os jovens do Brasil. Rio de Janeiro. Facso Brasil.
Wasserman, D., Cheng, Q., & Jiang, G. X. (2008). Global suicide rates among young people aged 15-19. World Psychiatry, 4 (2), 114-120.
World Health Organization. (2014). Preventing suicide: A global imperative. Geneva, Switzerland.