
Você cuida do seu medo?
22 de outubro de 2020
Sim, eu sei… parece uma pergunta estranha, mas se pensarmos que o medo é algo natural e instintivo do ser humano, que nos acompanha desde sempre, sendo algo fundamental para garantir a preservação, não teria problema, certo?
A grande questão é quando esse medo começa a te paralisar frente às situações, passando a ser algo que te impede de fazer alguma coisa, deixando de ser natural e sendo prejudicial para as suas relações e atividades do dia a dia.
O conceito de medo
Existem vários tipos de medo, como medo de falar em público, medo de avião, de animais, do desconhecido. Mas neste artigo, vamos elencar dois medos específicos, a partir de dois autores da psicanálise.
Assim, trazendo para reflexão e aproximando da psicanálise, a partir de Freud, o conceito de medo se atrela a angustia e ao desejo, se referindo aos dois como irmãos. Ignorar, ou fingir que ele não está lá, não vai fazer com que ele desapareça, já que se trata de um estado de angustia que remete a sentimentos de inibição e de repressão.
O medo desperta a insegurança, sentimento de impotência, gerando a evitação e promovendo a ideia de incapacidade, muitas vezes sendo relacionado com a timidez.
A timidez pode ser uma faceta deste medo, um modo de apresentação ou entendida como uma vertente, já que diz de uma forma do medo: o da exposição. Quem é tímido não quer chamar a atenção, uma vez que, conscientemente, isso faz com o que os julgamentos sejam de alguma forma autorizados.
Mas existe um grande conflito que sustenta tudo isso, e remanejar a vida para que não aconteçam situações de exposição é possível? Evitar não é sinônimo de solucionar, ou no caso, elaborar.
Uma outra faceta de apresentação do medo, agora, partindo de Winnicott, e tido como atuais medos adultos, são os medos voltados à dependência e o medo da maternidade.
Observando o medo da dependência, este pode estar atrelado às experiências infantis que sequenciam até a vida adulta, tendo sempre alguém elencado para ser uma forma de líder para a legitimação dos seus atos, numa forma de referencial do outro e não necessariamente de si mesmo, como uma maneira de ditadura.
Já no medo da maternidade, precisamos considerar que se determina a mulher, e que esta está inserida desde o início em um contexto de cuidados transgeracionais. Sejam estes na condição de filha, de mãe e de avó, ou seja, aquela que carrega a inscrição de cuidar do outro, que vem acompanhado de ansiedades pertencentes à uma imagem identitária introjetada desde a infância. Desta forma, isso pode levar a conflitos internos dos quais não condizem com o desejo da pessoa em questão, gerando ansiedades e cobranças relacionadas a sua identidade.
Com isso, aprofundando-se nas raízes do medo, podemos observar que as falhas e os traumas que já ocorreram apresentam a condição em que a pessoa se encontra indicando a sua totalidade, onde os medos fazem parte da sua história pessoal, e da sua subjetividade. E é a partir deles que se encontram os caminhos para ressignificá-los, uma vez que o medo se apresenta como uma defesa e não se trata especificamente da ideia de um problema, mas sim, da possibilidade de uma solução.
Como cuidar do medo?
Vamos pensar assim, o medo é uma pontinha do iceberg, e logo, há todo um conteúdo muito maior e que está imerso, passível de ser descoberto. Olhar para o seu medo, é o primeiro passo para se relacionar com o seu desejo, e assim, ter mais consciência sobre si, já que ele diz sobre você e sobre os seus modos de lidar com o mundo.
Após identificar as raízes do medo, podemos chegar através da análise, na ressignificação de novos sentidos a estes medos que correspondem a ponta do iceberg.
O processo analítico pode ser uma ótima ferramenta frente ao medo e as suas formas de se apresentar.
Olhar para o medo faz com que você entenda o que o constitui, e assim, possibilita dar um novo sentido. Buscar ajuda não é sinal de fraqueza e isso não é um “problema bobo”.
Citando Guimaraes Rosa:
“O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que quer da gente é coragem”.
Coragem para se (re)descobrir. Cuide de você!