Como incluir e cuidar de colaboradores LGBTQIA+?

Junho é mundialmente conhecido como o Mês do Orgulho LGBTQIA+. 

Se você é uma pessoa heterossexual e cisgênera, provavelmente você sabe disso por causa das campanhas realizadas por empresas no mês de junho. Mas isso não é o suficiente, né? 

Aliás, se a sua empresa também quer manifestar apoio, é melhor conhecer mais sobre o assunto do que repetir o que todo mundo está fazendo. Não cola mais. 

Até porque não estamos falando sobre algo sem importância. 

Pelo 14º ano consecutivo, o Brasil é o país que mais mata travestis e transexuais segundo a Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais). Além disso ainda existe a violência física, psicológica e social com todas as outras letras: gays, lésbicas, bissexuais, assexuais, pessoas intersexo, queer, entre outros. 

Então, antes de simplesmente colocar o símbolo do arco-íris no perfil do LinkedIn, evite uma crise de imagem – como vemos acontecer com muitas empresas que são desmascaradas ano após ano. 

Por isso, neste artigo, trouxemos tudo o que você precisa saber para conhecer com mais profundidade este universo, suas características e desafios! Assim você pode verdadeiramente fazer a diferença e tornar a empresa mais colorida. 

Você vai ver:

  • Pride Month: a origem do movimento pela diversidade sexual
  • A população LGBTQIA+ no contexto brasileiro
  • O mercado de trabalho para pessoas LGBTQIA+
  • Como inserir pessoas não-heterossexuais no ambiente de trabalho?
  • A saúde mental das pessoas LGBTQIA+
  • Como cuidar da saúde mental de funcionários LGBTQIA+?

Pride Month: a origem do movimento pela diversidade sexual

O Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ (28 de junho) teve sua origem na Revolta de Stonewall. Em 1969, o Stonewall Inn era um bar em Nova York que funcionava como um refúgio para gays, lésbicas, travestis e outras pessoas de sexualidade dissidente. 

Numa batida policial para averiguar a licença para vender álcool – a terceira em menos de um mês – homens gays, drag queens e travestis foram brutalmente agredidos pelas autoridades. 

Mas a situação ficou ainda pior quando estes começaram a reagir diante da violência policial. 

Foi a última gota que faltava para que a comunidade LGBTQIA+ se unisse e fosse às ruas protestar por seus direitos. Uma marcha foi liderada por Marsha P. Johnson e Silvia Rivera, mulheres transexuais afro-americana e latina, respectivamente. Ambas são símbolos importantíssimos para o movimento até hoje. 

Com tudo isso, o mês de junho não poderia ser esquecido. 

No ano seguinte, foi organizada a primeira Marcha do Orgulho Gay, que se transformou na Parada LGBTQIA+ e existe até hoje em diversos países. 

A Parada de São Paulo, inclusive, é conhecida como a maior do mundo. Em 2023, na sua 28ª edição, foram contabilizadas 4 milhões de pessoas nas ruas paulistanas. 

A população LGBTQIA+ no contexto brasileiro

Não é por acaso que usamos “população” e “comunidade” ao falar de pessoas LGBTQIA+. Cada letra tem seus desafios e questões particulares e cada uma delas merece visibilidade. 

“Ah, mas são muitas letras. É muita coisa para lembrar.” 

Sim, ainda bem! 

Isso significa que estamos avançando em relação à diversidade sexual. Se você não conhece uma a uma, é essencial que você busque esse conhecimento. 

Afinal, como você vai conseguir dar suporte acolaboradores gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais, intersexuais, assexuais e queer na organização em que trabalha?

Principais conquistas nas últimas três décadas

Nas últimas décadas, houve muitas conquistas em relação à diminuição do estigma. Inclusive em relação à saúde. 

  • 1997 – A cirurgia de redesignação social foi considerada legal pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). 
  • 1999 – Proibição de terapias de conversão sexual – como a “cura gay” – pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP).
  • 2009 – O SUS, através da Portaria 1.820/2009, permitiu a pessoas trans a utilização do nome social. Em 2013, a mesma política foi adotada pelo Ministério da Educação para realização do Enem. 
  • 2010 – Foi legalizada, pelo STF, a adoção de filhos por casais homoafetivos. 
  • 2013 – Logo em seguida, também foi legalizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) o casamento entre pessoas do mesmo sexo. 
  • 2020 – Só a partir deste ano homens gays e bissexuais puderam começar a doar sangue. A associação errônea destes com a transmissão de HIV, há décadas criticada por entidades e profissionais da saúde, finalmente foi derrubada. 

Dados e desafios atuais

Mas, quando buscamos entender a realidade atual para além de propagandas na televisão ou nas redes sociais, ainda nos assustamos.

Veja alguns dados:

  • Existem mais de 19 milhões de pessoas assexuais, bissexuais, lésbicas, gays e transgêneros no Brasil segundo o IBGE.

O próprio IBGE afirma que este número pode ser subnotificado, uma vez que a LGBTfobia ainda é muito marcante no Brasil e muitas pessoas ainda têm medo de declarar sua verdadeira orientação sexual e identidade de gênero. 

Prova disso é que:

  • O Brasil é o país que mais mata pessoas travestis e transexuais no mundo há 15 anos;
  • A cada 32 horas, duas pessoa LGBTQIAPN+ é morta no Brasil, segundo o dossiê divulgado pelo Observatório de Mortes e Violências contra LGBT+

E, embora diante destes números não pareça, a LGBTfobia é crime no Brasil. Ela foi enquadrada na Lei de Racismo em 2019 e, portanto, é inafiançável e imprescritível. 

Quem cometer qualquer tipo de violência a pessoas LGBTs, sejam verbais ou físicas, podem encarar de 1 a 3 anos de reclusão. 

O mercado de trabalho para pessoas LGBTQIA+

Lembra que falamos sobre cada letrinha da comunidade LGBTQIA+ ter suas questões e desafios próprios? Olhar para a diversidade sexual no mercado de trabalho pode ajudar a ilustrar isso para pessoas de fora da comunidade. 

Travestis e mulheres transexuais, por exemplo, são de longe as mais afetadas. Uma pesquisa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) mostrou que apenas 13% delas estão no mercado de trabalho formal. 

As 90% restantes têm como única forma de sobrevivência a prostituição. A travesti, escritora e doutora em literatura pela Unicamp, Amara Moira, fala sobre a sua própria vivência:

“A prostituição em que estão inseridas as travestis é precária, mal remunerada e coloca nossos corpos em risco. Se fosse uma prostituição que paga R$ 300 por hora, a gente comprava nossa cidadania.” 

Independente da sua visão sobre o assunto, o fato é que a sociedade exclui, sim, pessoas trans do mercado de trabalho. Aliás, a principal questão para toda a comunidade LGBTQIA+ é que quanto mais trejeitos que “denunciem” sua orientação sexual e identidade de gênero, mais ela será excluída.

Isso também acontece, embora em proporções menores, com homens gays afeminados, mulheres com expressão de gênero masculina, pessoas não-binárias, entre outros. 

Mas ainda existem muitas pessoas que tem preconceito com qualquer pessoa que não seja heterossexual.

Uma pesquisa do Center for Talent Innovation, divulgada pela Catho, afirma que 33% das empresas brasileiras não contrataria nenhuma pessoa LGBTQIA+ para cargos de chefia e 41% dos funcionários diz já ter sofrido discriminação pela sua orientação sexual no ambiente de trabalho. 

Já outra pesquisa da própria Catho afirma que 52% das pessoas já sofreram preconceito no local de trabalho. Para eles, a LGBTfobia acontece com frequência. 

Vale lembrar, inclusive, que esse tipo de atitude é duplamente criminosa, já que além de ser enquadrada como crime pela Lei do Racismo, também pode ser configurada como assédio moral pela nova Lei de Assédio.

Como inserir pessoas não-heterossexuais no ambiente de trabalho?

Depois de conhecer todos esses dados, é importante criar estratégias para combater essa cultura de discriminação e preconceito que ainda existe em boa parte das empresas. E, para isso, fazer ações pontuais está longe de ser o suficiente. 

A conscientização precisa acontecer todos os meses do ano e com todos os colaboradores: de líderes a terceirizados. Além disso, precisa incluir tanto pessoas LGBTQIA+ quanto pessoas heterossexuais e cisgêneras. 

Veja algumas ações que, quando combinadas, podem mudar consideravelmente o cenário atual! 

Criar uma cultura LGBT friendly

O primeiro passo para incluir gays, lésbicas, pessoas trans, queer, assexuais, etc., na empresa é mostrar que ela abraça valores como diversidade e inclusão. 

Aliás, você sabe a diferença entre tornar o ambiente corporativo diverso e torná-lo inclusivo?

Uma empresa diversa tem pessoas LGBTQIA+ no seu quadro de funcionários e parceiros. E não só aquela cota de 5%, viu? Estamos falando de pelo menos 20% das pessoas. 

Já uma organização que inclui estas pessoas é a que não só as contrata, mas faz de tudo para que haja uma real igualdade de oportunidades, para que todos possam crescer, desenvolver-se e serem valorizados. 

Isso significa combater a desigualdade colocando todos no mesmo ponto de partida e reparar as injustiças históricas oferecendo mais treinamentos, por exemplo, para quem teve menos oportunidade.

Estabeleça políticas e normas anti-LGBTfobia

Também é fundamental que isso seja oficializado nas normas da empresa. 

O combate à LGBTfobia é algo muito sério e precisa de esforços de todos os segmentos para realmente acontecer na prática.

Atualizar os funcionários sobre a inclusão dessas novas regras, se elas ainda não existirem, é muito importante. Assim como informar que a discriminação contra pessoas não-heterossexuais e cigêneras é crime segundo a legislação brasileira. 

E, claro, elaborar meios para certificar-se que as normas serão cumpridas. 

Realizar ações e campanhas com foco em diversidade sexual

Junho é um mês importantíssimo, claro, mas não basta realizar ações neste período e esquecer do assunto nos outros onze meses do ano. 

Já pensou, por exemplo, como o Outubro Rosa precisa incluir não só mulheres, mas também mulheres e homens trans não-mastectomizados

E como o combate a AIDS e DSTs é erroneamente direcionado para a população LGBTQIA+ quando os maiores transmissores são pessoas heterossexuais

Segundo um artigo publicado na revista Estudos e Pesquisas em Psicologia, a transmissão de AIDS, por exemplo, é maior em mulheres heterossexuais solteiras. 

Além destas campanhas, que são bastante conhecidas, você pode:

  1. Inserir um debate sobre a saúde mental de pessoas LGBTQIA+ no Janeiro Branco
  2. Falar sobre cada letra nas suas respectivas datas:
  • Janeiro: mês da visibilidade trans
  • Agosto: mês da visibilidade lésbica
  • Setembro: mês da visibilidade bissexual
  • Outubro: mês da visibilidade assexual e intersexo
  1. Abordar as taxas de suicídio e maneiras de prevenção no Setembro Amarelo

Garantir que existam colaboradores e líderes LGBTQIA+

Como já foi dito, uma empresa diversa possui colaboradores e líderes de sexualidades diversas. 

Um líder heterossexual que apoia pessoas LGBTQIA+ pode inspirar muitas pessoas. Mas uma líder lésbica ou bissexual, por exemplo, além de inspirar, pode ajudar a educar os liderados. 

Sua presença é fundamental dentro de qualquer empresa. 

Utilize comunicação inclusiva

A comunicação neutra ou inclusiva não possui marcadores de gênero. 

Não usa “todos” como sinônimo de “todas as pessoas” por entender que o plural não deveria envolver só o sexo masculino – como é demarcado no português e em outras línguas latinas.

Já parou para pensar porque os plurais com sufixo “o” – como “todos”, “seres humanos”, “funcionários”, “empresários” – é usado quando queremos falar de todas as pessoas, independente do seu gênero, mas as palavras com marcador feminino só se referem às mulheres?

Talvez você já tenha visto alguém usar “todes” ou falar em “pessoa colaboradora”. Nada disso é errado e muito menos frescura. 

Pode ser um detalhe sem importância para quem nunca se olhou no espelho e não conseguiu se reconhecer no corpo designado ao nascimento – algo que acontece muito com pessoas trans.

Ou ainda, para quem se identifica como pessoa não-binária e não se sente incluíde no gênero masculino nem no feminino. 

Se é possível ajudar colaboradores trans e não-bináries, por que não fazer isso?

Crie um canal de denúncia

Mesmo assim, o preconceito está muito arraigado na nossa sociedade. Apesar da diversidade sexual existir não só na espécie humana como em muitas outras de mamíferos – ou seja, é algo completamente normal e esperado – as discriminações continuam. 

Se você aplicou algumas ou todas as ações descritas nos itens anteriores, mas ainda continuam existindo casos de LGBTfobia no ambiente de trabalho, é de vital importância criar um canal de denúncias anônimo e, de preferência, terceirizado. 

Desta forma, as pessoas sentem-se mais seguras para buscar seus direitos. E, claro, se as denúncias forem comprovadas precisam haver punições administrativas. Do contrário, mais uma vez, o apoio só acontece no discurso, mas não na prática.

Enquanto isso, pessoas LGBTQIA+ continuam sendo violentadas. 

A saúde mental das pessoas LGBTQIA+

Você já imaginou como é viver como uma pessoa não-heterossexual? Para além das violências físicas, já pensou como é viver com medo de fazer demonstrações públicas de afeto? Desde segurar a mão do parceiro até beijá-lo na rua. 

Além disso, o “sair do armário” é um momento crucial e que dispara a ansiedade, já que ainda são muitas as famílias que simplesmente não aceitam nem respeitam a sexualidade ou identidade de gênero dos filhos, filhas ou filhes. 

Esse, inclusive, é um dos maiores motivos para o altíssimo índice de suicídio na população LGBTQIA+. 

Um estudo publicado na Revista Eletrônica Saúde Mental, Álcool e Drogas mostra que 20% dos adultos LGBTs já tentaram o suidício e que, nos Estados Unidos, enquanto 8 a 13% da população heterossexual tem ideação suicida, entre os LGBTs esse número é de 36 a  42%. Os números mais altos são de mulheres LGBTs, inclusive.

Entre os LGBTs, a maior taxa de suicídio é a de mulheres bissexuais. Elas também carregam os maiores índices de ansiedade, transtorno de humor e depressão  – segundo uma pesquisa do America Journal of Public Health, divulgada no site do Bi-sides, um dos maiores coletivos bissexuais do Brasil. 

Porém, mesmo alto, esse número ainda é bem menor do que os índices de suicídio na população trans. 

De acordo com a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), a cada 10 pessoas trans, 4 já tentou suicídio. Esta representa 66% das hospitalizações desta população. 

Durante a pandemia, inclusive, um estudo da Fiocruz mostrou que houve piora da saúde mental para 55% das pessoas LGBTQIA+. Nos Estados Unidos, quase a metade dos jovens não-heterossexuais considerou seriamente o suicídio em 2021, segundo uma pesquisa divulgada na Carta Capital

Como cuidar da saúde mental de pessoas LGBTQIA+?

A saúde mental da população LGBT+, sem dúvida, é mais sensível e merece um cuidado maior. Os números acima são, sim, assustadores; mas ainda mais assustador é fechar os olhos para essa realidade.

Como responsável pela saúde mental dos seus colaboradores, é sua função não só olhar, mas implementar práticas para melhorar este cenário. Para o bem deles e também da organização. 

Veja algumas formas de demonstrar seu apoio!

Oferecer benefícios de saúde especializados

Ainda não existe um plano de saúde que atenda especificamente pessoas LGBTs. 

Infelizmente, porque o preconceito dos médicos e a falta de informação destes também é um grave problema. Isso dificulta o acesso à saúde e ainda pode gerar muitos traumas. 

Desde a recusa de chamar uma pessoa trans pelo seu nome social à demonização da sexualidade alheia. Novamente, é importante reafirmar que LGBTfobia é crime, mas ainda continua acontecendo em vários espaços de convívio social. Inclusive aqueles que deveriam acolher e cuidar. 

Esta reportagem do Estadão mostra vários casos de violências simbólicas cometidas por médicos e também referencia várias cartilhas que já existem para orientar profissionais da saúde. 

Por isso, vale a pena pesquisar e investir num plano de saúde que tenha profissionais com experiência em tratar pessoas LGBTQIA+.

Incentivar redes de apoio no trabalho

Um ponto fundamental para a manutenção da saúde mental de pessoas da comunidade LGBT+ é a existência de redes de apoio. Elas são fundamentais já que muitas vezes a família e os amigos heterossexuais não os entendem, quando não julgam e tem dificuldade de aceitá-los. 

Redes de apoio LGBTQIA+ significam empoderamento e fortalecimento psicossocial. É também através delas que conseguimos diminuir as taxas de suicídio e de transtornos psicológicos. 

Incentive a criação destas redes na sua empresa! Criar grupos e fazer eventos para colaboradores LGBTs são ótimas opções para começar. 

Apoio psicológico

Mas, talvez o pilar mais importante para a manutenção da saúde mental seja a oportunidade de fazer terapia e, assim, poder contar com a ajuda de um profissional especializado. Se este também for uma pessoa LGBTQIA+, melhor ainda! 

Sim, as redes de apoio são incríveis, mas conversar com um amigo é totalmente diferente de fazer terapia. 

Com um amigo você desabafa e isso traz um alívio momentâneo, sem dúvida. Porém, a escuta de qualidade que o psicólogo pode proporcionar muitas vezes é responsável por ajudar os pacientes a encarar a sua realidade de outra forma.

Isso significa retrabalhar os traumas, rever padrões de relacionamento e melhorar a autoestima, entre muitas outras formas de proporcionar o autocuidado.

A Vittude é uma empresa que apoia os direitos e a felicidade das pessoas LGBTQIA+ e pode ajudar a sua empresa a fazer o mesmo! 

Desde a realização de rodas de conversa e treinamentos até o apoio com uma plataforma de psicólogos rigorosamente selecionados. Saiba mais conversando com um dos nossos especialistas!

Autor

Carol Motta

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Redatora sênior, especialista em SEO On Page, cientista social e com experiência em conteúdos de saúde e RH. Trabalha para viver num mundo em que as pessoas sejam mais saudáveis e as organizações, mais inclusivas.